CARTA
AO DIA SEGUINTE
Esta
noite não posso me apaixonar! Não há lugar para esta vã emoção
nesta noite. Nem em sonho, pois esta noite não quero dormir! Pelo pouco que se pode ser numa noite,
ou pela grande intenção que sobra em músculos e idéias de um corpo
diurno taciturno, a noite torna-se um alívio quando chega o crepúsculo...
Então
vou escrever alguma coisa de próprio punho. Suponho que o sono me deixe
no abandono dos que não querem adormecer. E antes de fechar os olhos
vou ler algum livro, ouvir qualquer música mesmo que venha de um longínquo
som. Enquanto relembro ou revejo em forte pensamento, as tantas bocas
que já tirei o batom, em noites tão gerais quanto esta.
Esta
noite vou sair do sério; (o quarto quarto à direita), que me
transforma enquanto durmo, me lançando num hemisfério que para a ciência
ainda é mistério. Muitas vezes fui assediado pelas oportunidades já
perdidas dentro daquele closed.
A
noite é uma criança! E se ela está
acordada, porque eu deveria
dormir?
Vou
vagar um pouco. E nesse
vaguejo quero ter você. Mas, se por obra do impossível tu não vieres
no pensamento, quero pelo menos ou
pelo que ainda posso
querer, quero vê-la então naquela lingerie vermelha. Aquela que gosto
de assisti-la despir-se dela durante as preliminares a que nos
entregamos antes do ápice do ato.
Quero
à noite, a mesma a que tenho me referido, verificar e vivificar cada
instante. Mas o mais importante de te querer como te quero pra sempre,
é apenas mais uma vez; esta é a noite que mais te quero. De corpo e
alma com bastante calma, antes da aurora
chegar.
E
quando; a mando de morfeu, a madorna vier me visitar, vou mandar dizer,
digo, direi eu mesmo que não estou pra ninguém. Sei que isto é
infame, mas quiçá eu a engane com esta conotação denotada por
palavras emboladas.
Esta
noite passarei às claras. Claras são as luzes que acendem
na minha mente, a cada idéia que tenho para esta noite. Vou
contar estrelas. Vê-las de uma ótica diferente. Indiferente a qualquer
poeta que já tenha feito isto, confisco pra mim este prazer incomensurável.
Mas
não se preocupe, é apenas um sonho antigo. Um sonho de passar a noite
acordado.
Como
uma missiva a um amor sem volta, uma carta ao dia seguinte, eu sou
apenas ansiedade sem respostas numa noite interior, anterior ao próximo
sol. Levitando sôfrego, dilacerado pelas horas que antecedem a já não
temida meia-noite.
Das
noites que passei acordado buscando o infinito, infinito era o leque de
coisas que chegava sem compreensão dos porquês das meias-noites serem
como são.
Com
um sentido de prazer e com jeito mórbido,
escrevo a alvorada voraz, que esta noite não quero dormir. Pois
não vou lhe dar o prazer de me achar inválido para tanto, dormir seria
um desperdício. Eu creio, eu quero, e peço ao faz de conta que esta noite demore acabar. Pois tenho alguns sonhos antigos, já sonhados que preciso realizar... Como aquele que para ela eu fui, desocupado dos problemas, livre de entraves e me entregava ciente feito um embrulho de presente... Ou então como aquele, quando na idade dos quinze, quinze minutos de beijo naquela boca; a boca do sonho, um sonho de boca sensual... fui interrompido pela madrugada ociosa, ansiosa pra me mostrar a aurora de um novo dia que trazia muitas promessas. Inclusive a de ser um dia muito especial naquela adolescência.
Vico Loduvico de Almeida |
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