Os nós e nós
©
Letícia Thompson
Quando queremos que alguma coisa fique ancorada
à nossa vida, fazemos de tudo para mantê-la presa à nós. Criamos laços e os
apertamos com todo nosso coração.
Os nós fazem parte de nós.
Infelizmente, nem tudo o que se apega a nós é
bom e útil. Se prezamos ter laços afetivos e pedaços de memórias agarradas
definitivamente à nossa pele, há aqueles nós que se apegam sem que nossa
permissão seja pedida e sem que tenhamos forças para desatá-los. Esses nos
acompanham e nos adoecem.
Viver com nós na garganta, que não descem e nem
saem, nos deixa deficientes. Avançamos em algumas outras coisas, mas o não
resolvido fica, como um espinho na carne.
Aquilo que não conseguimos engolir é o perdão
que não conseguimos oferecer, é o esclarecimento que nunca nos foi dado, são os
porquês nunca respondidos.
A gente caminha, mas sente que algo ficou pra
trás e muitas das dores de garganta que não conseguimos curar são emoções presas
das quais não soubemos nos livrar. O que fica atravessado diante de nós é o peso
que carregamos por vezes por anos e anos.
O dia bendito em que conseguimos colocar em
palavras e lágrimas aquilo que nos ofendeu, entrou em nós e ficou, o sol
desponta no horizonte como se fosse seu primeiro dia.
Ah, Deus, se tivéssemos sempre a coragem de
abrir nosso coração e gritar nossa mágoa, quão mais leves e sãos poderíamos
viver!
Por que esse medo de expôr o que nos desagrada?
Por que temer ferir o outro quando estamos, nós mesmos e inteiramente, sangrando?
Por que a felicidade alheia, se felicidade alheia há, é mais importante que a
nossa?
Grande parte dos nossos problemas, das nossas
doenças até físicas, são falta de comunicação. Por que não dizemos, não passamos
ao outro o que sentimos, não falamos do sentimento de injustiça que sentimos e
do quanto isso nos abala.
Falar é importante. No bom momento, claro, que
com sabedoria deve ser escolhido, mas é muito importante. O que não dizemos, o
outro não é obrigado a adivinhar e isso nunca podemos cobrar.
Os nós não resolvidos atam nossa vida a um
certo momento. Não crescemos como convém e mesmo nosso riso é sempre manchado
por uma pinta de tristeza que traduz nosso olhar.
Quando sentiu que tinha que se revoltar no
Templo, Jesus se revoltou, nenhuma palavra poupou; quando a dor e tristeza foram
grandes demais no seu seio, Ele chorou; quando o cálice tornou-se por demais
amargo, falou com o Pai...
A liberdade só nos chega quando liberamos nosso
ser, quando oferecemos ao outro o direito de ouvir, perdoamos o que deve ser
perdoado e aceitamos o que deve ser aceitado.
Se criamos a coragem de desatar, devagar, certo,
mas desatar, um a um os laços que nos incomodam, liberamos uma a uma as
ansiedades, os males que nos doem física e psicologicamente.
Nessas horas nosso coração bate de maneira
diferente, respiramos mais ar puro e nossos olhos se abrem para novos horizontes.
Só um pequeno passo, um muito de coragem e uma nova vida pode começar.
Letícia Thompson
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